ARLS GUARDIÕES DO TEMPLO N. 7061 

Templarismo e Maçonaria

Templarismo e Maçonaria

 

Há intrínsecas relações entre o Templarismo e a Maçonaria.

A começar, tem-se no Rito de York, hoje, a afiliação de uma organização filantrópica internacional que leva o título de “The United Religious, Military and Masonic Orders of the Temple and of St John of Jerusalem, Palestine, Rhodes and Malta” (“As Unidas Ordens Religiosas, Militares e Maçônicas do Templo e de São João de Jerusalém, Palestina, Rodes e Malta”), e que carrega a designação de “Cavaleiros Templários”. Trata-se de "Ordens dentro da Ordem", ou seja, é restrita a Maçons já iniciados e que professem a fé cristã, bem como congrega ordens como os Cavaleiros da Cruz Vermelha (do Rito de York e restrita ao organismo norte-americano), os Cavaleiros de Malta, os Cavaleiros de São Paulo e os Cavaleiros do Templo.

Há um grau de Cavaleiro Templário que decorre das Ordens de Cavalaria reunidas nesta organização, com exigências bastante distintas daquelas comuns aos graus maçônicos simbólicos como, por exemplo, a de que o Maçom seja casado para que seja exaltado Mestre.

Com isso, hoje, há uma organização nominadamente templária tanto dentro (como parte do Rito de York) quanto fora da Maçonaria. Mas as suas relações com a Maçonaria não são, por isso, harmoniosas. Tanto o Vaticano condena a existência dessa organização, uma vez ligada à estrutura maçônica regular, quanto diversos Corpos Maçônicos acusam-na de tratar-se de uma organização cristã dentro da Maçonaria, esta que deveria zelar, por princípio, pela liberdade religiosa exigindo de seus quadros que acreditem num Princípio Criador-Incriado, o que não corresponde, necessária e exclusivamente, à concepção cristã de Deus, podendo um budista, um umbandista ou um muçulmano, por exemplo, serem maçons.

No entanto, o que pretendemos perscrutar aqui não é a existência, em termos formais, de uma organização templária atrelada à institucionalidade maçônica; mas da presença do que podemos chamar de templarismo, referindo uma espécie de corpo doutrinário e de natureza filosófica, na Maçonaria.

Não significa corroborar com as narrativas bastante frágeis e já desacreditadas por historiadores de que a Maçonaria teria se originado dos Cavaleiros Templários naquelas realidades onde, no final do século XIV, seus reminiscentes teriam escapado ao morticínio que marcou o fim da Ordem do Templo.

O primeiro registro dessa narrativa a ser propalado entre maçons fez-se em 1737, quando o Cavaleiro de Ramsay discursou na Loja de Epernay, na França, defendendo a origem templária da Maçonaria. O “discurso de Ramsey” deu origem, por sua vez, a toda uma tradição oitocentista que influenciou diretamente a criação de altos graus, sobretudo, na França e na Alemanha, por onde essas narrativas se espraiaram fomentadas por Lojas Escocesas (a dos Antigos), encontrando severa resistência por parte das Lojas Inglesas (a dos Modernos).

Antes disso, em 1714, o duque de Antin afirmou que um grupo de cavaleiros, refugiados na Escócia após a destruição da Ordem do Templo e que teriam auxiliado o Rei Robert Bruce na Batalha de Bennockburn, aos 24 de junho de 1314, além de terem recebido o posto de Cavaleiros da Cruz Rósea, teriam sido feitos maçons em Kilwininning.

Até o momento, no entanto, não se pôde comprovar a veracidade das informações prestadas pelo duque. O que se sabe, contudo, é que há registro do ano de 1638, numa Loja de Perth, na Escócia, onde se lê que, na Ordem Real, já existia o Grau de Cavaleiro Rosa Cruz e que a Maçonaria Especulativa ali também se fazia presente: “pois somos Irmãos da Cruz Rósea, temos a palavra dos maçons e a segunda visão”.

E é desde a França que o Sistema da Estrita Observância Templária é composto ao escocismo e às doutrinas da Ordem Martinista dos “Elus Cohens”, fundada em 1768 por Martinetz de Pasquallys. De acordo com a historiografia especializada, Jean-Baptiste Willermoz, discípulo e continuador da obra de Pasquallys, foi quem procedeu a fusão estruturando, em 1756, O Rito Escocês Retificado, consolidado, por sua vez, em 1778 no Convento de Lyon e reafirmado no Convento de Wilhemsbad, em 1782.

Mas voltemos ao “Discurso de Ramsey” porque da propagação da narrativa de uma origem templária da Maçonaria decorre também o nascimento do Escocismo, abrindo-se aí uma bifurcação: uma tradição inglesa e uma escocesa que dividiria a Maçonaria nos anos seguintes.

É dessa linhagem que devemos conceber a criação, em 1743, do Grau Eleitos Menores ou Grau de Kadosh, em 1747 do Grau Primordial Jacobita da Rosa-Cruz e em 1748 do Grau de Escocês Fiel.

 Em 1754, é criada a Ordem Maçônica “Estrita Observância Templária”, que até 1782 disputou o legado dos Cavaleiros Templários na Maçonaria, tendo sido extinta em razão da consolidação do Rito Escocês Retificado que, como vimos, conjugou templarismo, escocismo e martinismo.

Também em 1754, dessa linhagem provém a estruturação do Capítulo de Clermont que conferia os graus de Cavaleiro da Águia, Templário e Sublime Ilustre Cavaleiro, núcleo embrionário do Rito de Perfeição.

Houve enorme resistência das Lojas Inglesas, a dos Modernos, que se opuseram aos graus estruturados a partir dessa narrativa; enquanto as Lojas Escocesas, a dos Antigos, os mantiveram e fomentaram até 1813, quando da criação da Grande Loja Unida da Inglaterra, onde prevaleceu a postura inglesa. Isso explica a profusão do escocismo, carregando consigo o templarismo e parte da tradição martinista, na França e na Alemanha onde acabaram se originando graus também de inspiração templária.

Os Graus Templários vigoraram, grosso modo, de 1799 até 1813, quando a criação da Grande Loja Unida da Inglaterra desencadeou a perseguição e expulsão dos graus maçônicos mais elevados, iniciativa reproduzida pela Grande Loja da Escócia. Com isso, os três graus dos Rituais Templários também vieram à termo: Noviço, Escudeiro e Cavaleiro.

Não nos esqueçamos que os graus eram vendidos e sua mercancia explorava, no processo de transição entre feudalismo e capitalismo, os anseios das classes burguesas mercantis emergentes, não-nobres, pela ascensão social ao repertório simbólico característico do mundo nobiliárquico, confundindo-se propositadamente títulos de nobreza com altos graus agora disponíveis àqueles em condições econômicas para adquiri-los. Ser cavaleiro e adentrar ao universo onírico da nobreza, ao menos em sua dimensão simbólica, esse era o desejo de muitos daqueles que galgaram esses graus.

Lembremo-nos também de que os Stewarts, exilados em França quando do experimento republicano de Cromwell, durante os primeiros anos da Revolução Inglesa, buscaram no Rito Escocês Antigo e Aceito a organização do movimento stuartista e descobriram, na venda dos altos graus que exploravam as narrativas templárias, um meio para a obtenção de recursos para a sua causa.

Nessa fusão, ingressam firmemente ao repertório simbólico maçônico, repleto de utensílios característicos dos pedreiros-livres e alusivos às anteriores guildas e corporações de ofício dos construtores de alvenaria, itens de cultura religiosa e de ordens de cavalaria, sobretudo a cruz e a espada.

E desde então essas representações jamais desabitaram o universo maçônico. Diversos são os ritos que provêm na Maçonaria, hoje, graus templários, remontando todos às mesmas míticas narrativas.

No caso bastante provável de não haver essa genealogia diretamente estabelecida, a Maçonaria é guardiã de muitos dos saberes "escavados" pelos Cavaleiros Templários que, uma vez trazidos para o universo simbólico e representacional da nossa Ordem, produzem a conexão entre elementos de cristianização de seus conteúdos ao hermetismo e, antes dele, aos saberes que provêm dos cultos iniciáticos, no Egito, ao deus Toth, as ciências totêmicas.

Há um vasto repertório alegórico e arquertípico que provêm do que podemos já afirmar como “mitologia templária”; e a inexistência de uma proveniência histórica direta com a Ordem do Templo não invalida e nem deslegitima, em nada, o templarismo que hoje também nos constitui.

Senão, vejamos: a busca pelo Sagrado nos lugares Santos, como metáfora da procura da Pedra Oculta, na jornada do Aprendiz, dentro de si, na viagem da qual deverá retornar Mestre. A necessidade de reconstruir o Templo de Salomão, os nove nobres Cavaleiros que o investigam, a terra Santa perdida e a busca por uma Nova Jerusalém, o martírio dos cavaleiros frente à perfídia e a crueldade de tirânicos poderes e a ética maçônica associada ao sacrifício por uma justa e nobre causa não para o engrandecimento pessoal, mas pela promoção de um bem maior, o que se expressa na sentença máxima do templarismo:

“Non nobis Domine, non nobis, sed nomini tuo ad gloriam” (Slm. 115:1 - Vulgata Latina, “Não a nós, Senhor, não a nós, mas pela Glória de teu nome”)

 

Texto do Ir:. Rodrigo Medina Zagni (M:. I:.)